quarta-feira, 23 de setembro de 2009

Seis Sonetos gaúchos de Alma Welt

Acabo de descobrir estes seis sonetos da Alma, inéditos, manuscritos num pequeno bloco:


Névoas (de Alma Welt)
1

A neblina que paira sobre a estância
A revela em sua falsa letargia.
Dois séculos de espera e de constância,
Lhe fizeram firme e cega companhia.

Quem chega ao casarão e suas soleiras?
Que esporas já retinem na varanda?
Que olhos doces de casadas e solteiras
Lacrimejam e se abaixam como manda?

Na névoa revivem os áureos tempos,
Os risos e esperanças se renovam,
Ainda não se contam contratempos...

No salão Anita entra, e Garibaldi,
E talvez esta família já comovam,
Que aqui não haverá quem deles malde.

(sem data)
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A prenda (de Alma Welt)
2

Sou guria orgulhosa deste Pampa
Que ousa cantá-lo em verso e prosa.
Que digam que a caixa só destampa
Quando os grandes fazem sua glosa!

Evocando a valente farroupilha,
Os maiores já contaram seus revezes,
Mas não com a candura de uma filha
Como eu que a espero tantas vezes

Na soleira desta casa tão vetusta
E ilustre em sua anciã modorra
Que nada faz crer que um dia morra.

Ostentando pelo menos um punhal
Reencontro Anita e não me custa
Galopear junto dela o meu bagual...


As Naus (de Alma Welt)
3

Leiam estes meus versos, ó futuros,
Não despendia assim tanta energia
Em rimas, em palavras de poesia,
Não quisera eu transpor tais muros.

Não estaria brincando no serviço
Ao inventar assim tantos motetos...
Há muito notariam meu sumiço
Aqueles que invejam meus sonetos

Se não fosse aquele ilustre clero
De farrapos e de homens como Netto,
Escoltando-me ao meu verso completo.

Mas como Anita se lhe falta o italiano,
Vejam, nos meus versos eu lidero,
E arrasto naus em meio ao Minuano...

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Os errantes (de Alma Welt)
4

As ocultas trilhas do meu pampa
Conduzem ainda ao meu portão,
E espectros saídos de sua campa
Assombram mesmo agora o casarão.

Não busco exorcizar ou demovê-los:
As velas são porque os quero bem
E procuro com meus versos comovê-los
Embora não me sinta sua refém.

Mas compartilho sim, a solidão,
De almas que malgrado sua paixão
Ainda erram e deixam suas prendas.

Eu mesma, a esperar Rodo, meu irmão
(que este vaga vivo em outras sendas),
Sou a novilha de um pródigo marrão...



A cigarra (de Alma Welt)
5

Quando chega o tempo das cigarras,
Eu que trabalhei como a formiga
Num romance, soltando as suas amarras,
Nem por isso dou ouvido à sua intriga.

Sou da raça daquela cantadora
E trabalhar pra mim é eufemismo.
Cantar, cantar, mesmo que amadora
Na glória do meu diletantismo!

Isso o é que faz feliz a pampiana
Sem os remorsos que me cobra
A lembrança da dura Açoriana...

Malgrado este prazer que quase aberra
Cantar, cantar a alma desta terra
E seu cenário ilustre... é minha obra!

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A Noviça do Pampa (de Alma Welt)
6

Olho o meu cenário de tal modo,
Que feliz por existir, como noviça
Eu abrindo os braços rodo e rodo
E agradeço isto ser pampa e não Suiça.

Meus avós aqui chegaram por acaso?
Não creio como creio no destino,
Embora misterioso, no meu caso...
Por quê o cabelo ruivo e o pêlo fino?

Esta herança germânica que teima
Em me deixar nostálgica do gelo
Que por aqui a geada, apenas, queima...

E esta pele tão alva como um halo
Que os gaúchos me querem ver o grelo
Apostando que é rubro ou muito ralo...

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